quarta-feira, 24 de abril de 2013

Mumia Abu-Jamal: a voz dos que não tem voz!




Mumia Abu-Jamal completa hoje 59 anos. Mumia passou 30 anos em isolamento no corredor da morte na Pensilvânia, nos Estados Unidos da Amerikkka. Mumia foi condenado a morte em 1982, acusado de ter provocado a morte de um policial branco no mais polêmico e injusto processo judicial dos EUA, país que detém o maior número de presos do mundo, mais de 2 milhões de pessoas encarceradas, 25% dos presidiários do planeta.
Em seus textos, lidos e traduzidos para vários idiomas, Mumia sempre denunciou o encarceramento em massa como estratégia de criminalização da população afro-americana, indígena, imigrantes que resistem ao estilo de vida predatório naquele país.
Após anos de pressões locais e internacionais, só em 2012 a pena de Mumia foi revertida para prisão perpétua, sendo ele transferido para um presídio que permite a ele conviver com outros presos e acesso a medidas menos rigidas que as do isolamento total de anos anteriores.
Jornalista e ativista afro-americano, Mumia, que atuou no Panteras Negras, nunca se calou diante do racismo e das injustiças cometidas pelo governo norte-americano e seus aliados no mundo. Mumia, mesmo preso e isolado, sempre se preocupou com as lutas por justiça e igualdade, tanto na Amerikkka quanto no mundo. Pela sua luta, ficou conhecido por ser voz dos que não tem voz num mundo em que o isolamento dos mais pobres tem raízes nas injustiças e desigualdades.
A liberdade de Mumia Abu-Jamal coloca em xeque o sistema de injustiça nos EUA e sua máquina de criminalização e encarceramento em massa. Modelo vigente de estado penal incentivado por empresas privadas que veem na quantidade de pessoas encarcerados um jeito perverso de extrair lucros da administração e gestão da mão de obra barata, da prestação de serviços e abastecimento de presídios, muitos dos quais nas mãos de empresas privadas. Modelo já em andamento, inclusive, em muitas democracias do mundo. 


 

Juventude encarcerada

Às vezes me assusta a pouca idade de alguns dos presos muito jovens ao redor de mim.

Tenho conhecido garotos que nunca ouviram falar de Chuck D (Public Enemy), Carlos Santana, Jimi Hendrix ou Bob Marley. Quando menciono estes nomes, os olhares vazios me dizem que não fazem a mínima ideia de quem são, ou quem era, estes grandes músicos. É impossível falar com eles sobre jazz. Seria como falar sobre as liras de antigos gregos.

Este é um lado do complexo industrial carcerário que a maioria das pessoas - ativistas inclusive - não ve. Crianças encarceradas, tão jovens que nem barba ainda tem, condenados a pasar décadas na prisão!

A maioria são alvos da "guerra contra as drogas", da economia ilícita que cresce em muitas comunidades urbanas, da fúria cega que levou ao auge o encarceramento em massa, o qual era - e continua sendo -, o programa de emprego rural nos Estados Unidos da Amerikkka.

Inimigos do Estado ao nascer, estas crianças receberam uma abominável educação punitiva e vazia, um preâmbulo a prisão. Suas escolas foram os campos de treinamento para as prisões.

O que fica claro, ou o que deve ficar claro a todos, é que o sistema atual não serve. Tem que haver mudanças drásticas neste sistema!

Não serei eu a elogiar a Suprema Corte* dos EUA. Seria o último homem a fazer isso. Mas é uma indicação da política nacional atual - a política de vingança, represálias e destruição em massa através do encarceramento - o fato de que foi a maioria da Suprema Corte que determinou que dezenas de sistemas carcerários estatais estão funcionando de maneira anti-constitucional. Me refiro ao recente caso Alabama versos Miller, o qual tem a ver com sentenças de cadeia perpétua para jovens. Quem disse isso fois esta Suprema Corte, a mais conservadora dos últimas 50 anos!

E o que nos diz sobre isso o poder legislativo?
E o que nos dizem sobre isso os polítcos negros?
E o que diz sobre isso o status quo político?

Só um forte movimento pode mudar esta alarmante realidade.

Direto da nação encarcerada, sou Mumia Abu-Jamal.

*Equivalente no Brasil ao STF (Superior Tribunal Federal)

 Publicado em outubro de 2012 [Tradução livre por Ruivo Lopes]

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Poetas se encontram para bate-papo sobre literatura divergente e cena cultural da cidade


 
A convite do Tenda Literária, vou chegar lado a lado numa roda de bate-papo com os parceiros Binho (Sarau do Binho) e Ni Brisant (Sobrenome Liberdade). O tema sugerido pela organização pra puxar a conversa foi Literatura Divergente e Cena Cultural da Cidade. Após o bate-papo, haverá um sarau aberto pra quem quiser chegar e soltar o verso e o verbo, alto e bom som. A roda vai acontecer no dia 20 de abril, às 19h30, no Café com Cultura, no espaço Anchietanum que fica na Rua Apinajés, nº 2033, Vila Madalena (SP). Participe!

domingo, 14 de abril de 2013

Redução da maioridade penal: a democracia no lodo da desigualdade

 



O da pólvora
Apodrece penitente,
O da caneta
Enriquece impunimente,
A um, só resta virar crente
o outro, é candidato a presidente

 Os miseráveis, Sérgio Vaz
 
É o que eles querem, mais um pretinho na Febem.
Um homem na estrada, Racionais MCs

O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) completa 23 anos este ano. A lei é considerada um avanço constitucional, porque foi o primeiro instrumento criado na então recente democracia para proteger crianças e adolescentes no Brasil, principalmente aquelas em permanente condição de vulnerabilidade social agravada pela pobreza. Muito elogiado na época de sua aprovação, o ECA serviu de modelo para que outros países do mundo implementassem instrumentos semelhantes de proteção a crianças e adolescentes. Entretanto, o ECA vem sofrendo um obscuro linchamento público midiotizado e, como sempre, aproveitando-se da forte comoção social.

Como quase tudo no Brasil, cria-se primeiro a lei e depois joga-se para a sociedade disputar a sua implementação. É unanimidade para quem atua diretamente na defesa da criança e adolescente que a rede de proteção para essa significativa parcela da população brasileira ainda é muito deficiente. O diálogo intersetorial que deveria envolver a educação, cultura, trabalho, saúde, esporte, moradia e segurança ainda não resultaram em política públicas efetivas que tenham impacto satisfatório no desenvolvimento social pleno de crianças e adolescentes e que lhes dê a garantia de uma juventude e um futuro seguro. Porém, quando estes se envolvem em crimes, tornam-se facilmente alvos da pretensão de condená-los duplamente. A primeira pela desproteção da sua condição específica e segundo pelo peso desproporcional da lei que se aplica no país.

Nesse sentido, é desastrosa a ideia do governador de São Paulo Geraldo Alckmin de querer propor mudanças na maioridade penal. Ele declarou que pretende enviar ao Congresso Nacional um projeto para tornar mais rígido o ECA. A proposta do governador é que adolescentes que tenham cometido crimes e tenham completado 18 anos não fiquem mais na Fundação Casa. O governador também defendeu penas maiores para os crimes graves ou reincidentes.

Com essa posição, o governador Geraldo Alckmin, mais uma vez, dá mal exemplo ao se aproveitar da situação para apresentar sua débil ideia. O Brasil é o quarto país com a maior população carcerária do mundo. O Estado de São Paulo tem hoje 198 mil presos. Todos em celas superlotadas, distribuídos em presídios, centros de detenção provisória e delegacias em situação desumana e degradante. Em regime de privação de liberdade no país são aproximadamente 17 mil adolescentes, destes 9.016 só em SP. A maioria internada por tráfico de drogas e apenas 0,9% em ocorrências com vítima fatal. Lamentavelmente, a cada ano os números não param de crescer.

Seria melhor que antes de promoverem um linchamento de uma lei que ainda não foi implementada na dimensão que ela exige, fossem linchados publicamente os políticos e seus porta-vozes midiotizados que anseiam corromper o ECA e a sociedade não com o objetivo de proteger crianças e adolescentes, mas sim para reforçar um Estado Penal, afogando a democracia no lodo perverso da desigualdade.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Tortura não é legal!

 
 
Somente doze anos depois do fim da ditadura militar (1964-1985), e nove anos depois da constituição de 1988, passou a vigorar no Brasil, a partir de 1997, uma lei específica que tipifica e pune o crime de tortura. Desde 2011, o projeto que cria o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura aguarda votação oficial. Na última terça-feira (2), o projeto foi aprovado na Câmara. Falta agora o Senado se posicionar. Organizações de defesa dos direitos humanos pedem correções no projeto.
 
Contrário ao projeto, o deputado federal Nelson Marquezelli (PTB-SP), teme que uma lei possa punir quem trabalha na área de segurança, especificamente policiais. "No interior, às vezes, o policial precisa ser mais rude com o bandido. Mas ai daquele que, para conseguir uma confissão, apenas ameaçar um delinquente, vai ter de responder na Justiça", disse. O deputado não estava sozinho nessa reação na Câmara ao projeto.
 
Tardia no país, a Lei 9455/97, foi criada justamente para proteger quem está em privação de liberdade ou sob guarda de agentes do Estado que, por exemplo, agirem de forma "rude", mediante ameaça para obter supostas confissões. Há decisões jurídicas no país que invalidaram depoimentos forçados mediante emprego de tortura. Já o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, composto também pelo Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, integrados mas com funções específicas, cria condições para que peritos monitorem instituições e faça recomendações e outras providências para combater a prática da tortura.
 
A tortura ainda é uma chaga institucionalizada no Brasil, praticada em sua maioria por agentes do Estado e alimentada também por quem deveria ter a obrigação de empregar esforços para combatê-la.
 
 
Em 2010, a TV Brasil fez uma reportagem chamada Tortura ainda assombra o Brasil (4min50s), tendo como base o Relatório sobre Tortura uma Experiência de Monitoramento dos Locais de Detenção, produzido pela Pastoral Carcerária. A reportagem é enfática ao afirmar que a prática da tortura, comum na ditadura, continua sendo uma realidade no Brasil. Aos 3min e 40 segundos, a reportagem explica o que é tortura e como ela deve ser punida. Assista!

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Teatro em dois tempos: Siré Obá e Morro como um País


Cia Teatro Nata exige respeito
para as religiões de matriz africanas
 
Na última sexta-feira (29), em pleno feriado cristão (Sexta-Feira Santa), aproveitei a folga e fui assistir a peça Siré Obá - A Festa do Rei, apresentada pela Cia de Teatro Nata, de Alagoinhas (BA). A peça encerrou a mostra Nova Dramarturgia da Melanina Acentuada que teve toda a sua programação sediada no Teatro Arena. A abertura da peça começou com um cortejo que saiu de dentro do teatro para a rua e pegou todo mundo que estava assistindo pela primeira vez de surpresa. Do ponto em que eu estava, uma cena única acontecia. Enquanto o cortejo entoava seu canto em exaltação aos orixás, a poucos metros dali, uma procissão de fiéis podia também ser vista se dirigindo para a igreja da Consolação entoando ladainhas católicas. Poucos minutos depois, o cortejo levou todo mundo que aguardava do lado de fora do teatro para o interior do Arena. A procissão levou os fiéis para o interior da igreja. A apresentação do Siré Obá tranformou o Arena num terreiro onde os orixas eram apresentados e porque não, no rito do teatro, fizeram ali também a sua festa. Religiosidade e arte afro-brasileira em cena. A Cia Teatro Nata envolvida pelo clima de posicionamento que marca o Arena exigiu o merecido respeito para as religiões de matriz africana, dizendo também alto e bom som: Feliciano não nos representa!

Kiwi Cia. de Teatro encena e debate ditaduras
 
No domingo (31), quando cristãos do mundo todo comemoravam a Páscoa, fui novamente ao teatro, dessa vez assistir a peça Morro como um país, da Kiwi Cia de Teatro, ainda em cartaz no Teatro Grande Otelo (SP). Presentes ali, diferentes gerações de ativistas sociais interessados na ressurreição da memória coletiva de um país que teve seu mais longo 31 de março da história. Foram 21 anos de ditadura militar, iniciada em 1964. Fazem, portanto, 49 anos do golpe que interrompeu não só a vida de inúmeras pessoas, mas também a vida política do país tocada, apartir dalí, a botinada e pau de arara. Parece que foi ontem, como a narrativa e os vários recursos usados na apresentação da peça parecem apontar. Estava combinado que depois da apresentação da peça aconteceria um debate para o qual foram convidados estudantes que representaram a Comissão da Verdade da USP (Campus Butantã e Largo São Francisco), Amélia Teles (Comissão Estadual da Verdade) e Ivan Seixas (Presidente do Condepe-Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), ambos perseguidos, presos e torturados pela ditadura militar brasileira (1964-1985). Aqui está um teatro que não apenas expõe o problema, mas convida a quem está diante dele a refletir e também se posicionar. O debate durou quase o mesmo tempo da apresentação da peça, índicio de interesse geral no que a arte ainda tem a nos dizer sobre a vida, a história e também o futuro.

Na ocasião, compartilhei com quem estava presente que o ranço autoritário da ditadura militar encontrou acento seguro na democracia. É possível observar isso, por exemplo, no tripé: Polícia Militar, Poder Judiciário e Meios de comunicação dominante.

Explico:

Adolescente perde a visão em
ação da Polícia Militar em Paraisópolis

Justiça Federal concede reintegração do Museu do Índio,
na ocasião ocupado pela Aldeia Maracanã (RJ)
 
 
Jornalista Luiz Carlos Azenha,
processado por criticar diretor da Globo
 
O jornalista Luiz Carlos Azenha, editor do Viomundo, blog onde você lê notícias que não são destaque na impresa dominante, foi  processado por Ali Kamel, direitor da Central Globo de Jornalismo. A Justiça carioca condenou Azenha a pagar 30 mil reais a Kamel. O crime do blogueiro foi ter criticado o todo poderoso Kamel pela postura adotada pela Globo na cobertura da campanha presidencial de 2006. A sentença abalou o blogueiro, mas ele tá vivo, como uma fenix!
 
É tempo de exorcizar de uma vez por todas a herança maldita deixada pela ditadura militar. A memória histórica de um país deve ser erguida em condição de verdade e nela se buscar a justiça, sem exceção. Taí, um bom começo!