Periferia de São Paulo [Foto Sharylaine]
MANIFESTO PERIFÉRICO
Pela Lei de Fomento à Periferia
SALVE PERIFERIAS!
Pra entender os escritos e as vozes do lado de cá, antes, é preciso entender o que vemos como PERIFERIA.
Compreendemos
PERIFERIA como espaço urbano geograficamente identificável, abrigo das
classes trabalhadoras brasileiras, da maioria da população negra,
indígenas urbanos e imigrantes e cujos traços culturais são entoados
pela heterogeneidade resultante do encontro (nem sempre pacífico) desta
convivência multicultural atravessada pela desigualdade social.
Periferia, não por acaso, substantivo feminino no qual se inscreve a
história corrente de inúmeras mulheres. Museu sem teto ou paredes,
bolsões de expressões ancestrais, tradicionais e experimentações
inovadoras, cuja geografia é território, marca identitária e também
espaço de exclusão econômica, com excesso de polícia e ausência de
políticas públicas que procurem agir na resolução das consequências de
um processo histórico de brutalidades sociais, desigualdades e injusta
distribuição de riquezas.
O termo PERIFERIA convocado
neste manifesto representa um ato político. Assumi-la como marca
identitária significa evidenciar as disparidades sociais, econômicas,
geográficas e culturais historicamente impostas, assim como, neste
contexto, considerar a desproporção de verbas públicas destinadas à
produção cultural das quebradas.
Reconhecer a capacidade
de sua população em mediar as contradições por meio da produção cultural
e da elaboração cotidiana de mecanismos que garantam a sobrevivência
coletiva, é compreender este território periférico como lugar de
resistência política. Ainda que as periferias tenham características
específicas entre si, a unidade está aí: relacionam-se com a questão
urbana em posição de desvantagem política, visto que historicamente os
olhos das políticas públicas buscaram privilegiar investimentos nas
áreas centrais da cidade, estimulando, mesmo que não intencionalmente,
novas lógicas de convivência, sociabilidade e manifestações culturais
nos territórios periféricos.
O que buscamos é a reparação
histórica, é inverter a lógica do mercado. Fundamentados no ponto de
vista de quem vive e produz cultura neste lugar, a periferia, e por
entender a tirania do processo de mercantilização que a tudo padroniza e
homogeneíza; que busca transformar em mercadoria toda a produção humana
e que, portanto, exerce forte pressão às manifestações culturais nas
quebradas para que se transformem em produtos à venda.
Reivindicamos
do Estado sua contraparte, assegurando políticas públicas que
viabilizem nossas práticas artísticas e culturais não baseadas no lucro e
na exploração; que existam mecanismos de fomento onde a gratuidade seja
garantida, a auto-sustentabilidade econômica não seja uma meta, a
subjetividade das periferias não seja transformada em mercadoria e que
as nossas produções não estejam reféns de um gosto universalizado,
tampouco nossas particularidades simbólicas sejam catalogadas como moeda
de troca.
O governo do Estado, há cerca de duas décadas, é
pautado por políticas neoliberais, sem praticamente qualquer política
pública voltada para grupos culturais ligados aos movimentos sociais. Na
cidade de São Paulo, embora exista políticas mais arejadas e com maior
diálogo com os movimentos, ainda há muito por fazer e avançar. Nossa
contribuição parte da premissa de que a discussão sobre financiamento
direto, garantido em lei, e descentralização de verbas é necessária e se
faz urgente.
Defendemos que os estados e municípios parem
de despejar milhões de reais, fruto de arrecadações dos cidadãos, para o
pagamento de JUROS das dívidas públicas – que representa hoje 13% do
orçamento do município de São Paulo[1], em detrimento do investimento de
apenas 0,7% de seu orçamento na cultura[2] (situação repetida nas
esferas estaduais e também federal). Esta política de irresponsabilidade
social engessa todos os governos, independentemente da coloração
partidária e desconsidera a maior parte da população, a população
periférica, produtora das riquezas com a força de seu trabalho e, ao
mesmo tempo, distanciada do usufruto desta produção.
FOMENTO PERIFERIA
Enquanto
sujeitos periféricos residentes e atuantes às margens metrópole,
propomos e defendemos a criação de uma LEI de FOMENTO à PERIFERIA, capaz
de estruturar econômica e poeticamente as coletividades das quebradas.
O
QUE É o FOMENTO PERIFERIA? É uma Política pública de investimento
direto, estruturada em lei e com dotação orçamentária própria, cuja
iniciativa potencialize a capacidade criativa e a articulação dos
coletivos artísticos periféricos, levando em conta a sua pluralidade
materializada em poéticas diversas.
A QUE(M) SE DESTINA?
Direcionada à produção cultural periférica, cujo protagonismo é o de
coletivos culturais com atividades continuadas.
O QUE
APOIA? Fomentará pesquisas, criação, formação, difusão e manutenção das
atividades artístico-culturais, assim como manutenção dos espaços
públicos ociosos por estes coletivos, ocupados e geridos com garantia de
autonomia política e administrativa.
NO QUE DIFERE DE
OUTRAS LEIS E EDITAIS? Diferente de outras iniciativas também
importantes como o VAI II e Pontos de Cultura, por contemplar não
somente sedes “pontos específicos” e por dispor de maior aporte
econômico às parcelas contempladas. O Fomento Periferia cobre uma lacuna
que inviabiliza os saltos poéticos a que estamos inscritos.
OU
SEJA... Uma POLÍTICA PÚBLICA proposta e produzida por agentes culturais
periféricos de modo a distanciar-se da lógica mercantilista, do caráter
eventual das ações culturais e da competitividade desigual dos editais,
considerando a cultura um direito humano, garantindo a descentralização
dos recursos e uma produção cultural autônoma, singular e continuada,
orientada pelas relações sociais estabelecidas por/entre agentes
artístico-culturais e suas comunidades.
É nóis por nóis!
FÓRUM DE CULTURA DA ZONA LESTE
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