Na roda José Castilho Marques Neto, secretário nacional do Plano Nacional do Livro e Leitura durante o governo Dilma; e Érica Peçanha,
doutora pela USP, autora de "Vozes Marginais na Literatura" (Aeroplano,
2009).
O encontro vai acontecer na Escola Municipal Hercilia de Campos
Costa (Rua José Pereira Cruz, nº 95, Parque Bristol (ao lado do
Telecentro Sacomã), zona sul de SP.
A política brasileira vive
tempos difíceis. Difíceis porque parece reduzida a capacidade de
imaginação política.
Nossa classe política, irresponsável e inconsequente,
lançou o povo brasileiro num mar de incertezas e angustias. Querem nos
fazer crer que não há alternativas.
Se por um lado as elites
conservadoras apostam no quanto pior melhor - para elas! -, por outro,
os progressistas, contaminados por anos de convivência com os
conservadores, tem adotado a estratégia
do medo ou a do "não há nada que seja ruim que não possa piorar". Adota-se estratégia conservadora e alheia ao campo progressista.
De ruim
a pior, atrofia-se a capacidade de imaginar alternativas políticas.
Esvaziada de imaginação, a política da lugar ao fatalismo e ao
autoritarismo conservador e também progressista.
Pois bem, falo aos
progressistas, já que não tenho interlocutores nas elites conservadoras.
Já disse e insisto, não há mobilização que se sustente apenas com
denúncia. A denúncia serve apenas para pintar o atual cenário político
do país. Confunde-se o contexto com a dinâmica no contexto. Ao contrário
do que alguns possam pensar, não é a denúncia que garante um campo ou
unidade de forças, mas sim o anúncio.
Neste momento, o campo
progressista carece de anuncio convincente e alternativo não só ao que
está, mas também ao que já estava aí.
O anúncio esta contido na potência
da vontade popular. Portanto, é hora de falar menos ao povo brasileiro e ouvi-lo
mais.
A vida política brasileira está na sua capacidade de reinvenção.
Reinventar a política significa experimentar e só experimenta quem não
tem medo.
O pragmatismo alienante da política brasileira nos levou a
beira de um precipício. Voltar pode até ser uma saída segura, mas não
menos conservadora.
Alinho-me aos que preferem pensar, experimentar e
construir, sem medo, um caminho possível para o outro lado!
Opinião pública explícita:
[Foto: Ruivo Lopes, SP, 2016]
Quem paga o bando escolhe a música
Bens x bem | Faz sentido empresas capitalistas doar dinheiro para
políticos de direita comprometidos com os bens privados. O que não
consigo entender é o que faz empresas capitalistas doar dinheiro -
legalmente ou não, pouco importa - para políticos de esquerda
comprometidos com o bem comum!
Bem x bens | Faz sentido políticos de esquerda comprometidos com o bem
comum negar doações de empresas capitalistas comprometidas com políticos
de direita defensores dos bens privados. O que não consigo entender é o
que faz empresas capitalistas comprometidas com políticos de direita
defensores dos bens privados querer doar dinheiro para políticos de
esquerda comprometidos com o bem comum!
África no Brasil
O escritor nigeriano Wole Soyinka, autor de "O leão e
a jóia", durante conferência no II Festival Afreaka, na sala Olido,
centro de SP!
Livreir@s & Leitor@s
A Passagem Literária da Consolação
com a avenida Paulista, região central de SP, é um lugar muito especial para livreir@s e
leitor@s. Faça uma visita, ouça boa música, aprecie exposições,
selecione um bom livro e bata um papo com a Odete, livreira há muitos
anos na Passagem! [Foto: Ruivo Lopes, SP, 2016]
Plano de Leitura se junta a iniciativas que buscam levar o universo
da leitura, do livro e da biblioteca a um número maior de paulistanos
Por Fausto Salvadori | fausto@camara.sp.gov.br
Para uma personagem como Thayaneddy Alves, 23 anos, negra, mulher e
moradora da periferia, tornar-se escritora parecia um enredo improvável
no cenário do Brasil, onde 94% dos autores são homens e 73% são brancos
(conforme pesquisa da professora Regina Dalcastagnè, da Universidade de
Brasília, divulgada em 2012). Mas Thayaneddy deu um jeito de escrever a
própria trama.
ESTREIA – Thayaneddy Alves no
lançamento do seu primeiro livro,
Em reticências
Foto: Peter Schraner
Não só se inventou poeta e organizou um evento literário,
o Sarau da Ponte para Cá, em Campo Limpo, zona sul, como publicou no
final do ano passado seu primeiro livro, a coletânea de poemas Em reticências,
por um selo que criou com os amigos e batizou de Academia Periférica de
Letras. “Venci as estatísticas”, comemora na contracapa.
Sem interesse pelos autores que conheceu na escola (“Drummond não me
representa”, diz), Thayaneddy bebe nas palavras das poetas das
quebradas: nomes como Débora Garcia, Jenyffer Nascimento ou Elizandra
Souza. “Se uma delas escreve sobre o sangue que jorrou de uma situação,
desde um parto, a menstruação ou uma agressão, dá para sentir o cheiro
no livro”, comenta Thayaneddy numa noite de fevereiro, enquanto
autografa um exemplar do seu livro em uma funilaria do Socorro, na
periferia sul de São Paulo.
INICIATIVA – Casulo comanda um sarau literário em sua funilaria, na zona sul de SP
Foto: Fausto Salvadori/CMSP
Funilaria? Isso mesmo. Uma funilaria que também é biblioteca
comunitária, com 600 livros colocados à disposição de quem quiser no
bairro, e que uma vez por mês também vira palco para o Clamarte, um
sarau de música e poesia. O dono da oficina, Gilmar Ribeiro Santos, 41
anos, o Casulo, desembestou a escrever aos 15 anos, após descobrir
Machado de Assis na escola. Mas só se convenceu de que poderia virar um
escritor quando conheceu o Sarau da Cooperifa, organizado pelo poeta
Sérgio Vaz, um dos primeiros representantes do movimento de saraus que
tomou conta da periferia paulistana a partir da virada do milênio.
Casulo escolheu fazer uma poesia com “um cunho social e político
muito forte”, porque acha “muito egoísmo um autor falar só do próprio
umbigo”. “O escritor tem que descer do pedestal”, diz. Seu primeiro
livro, Dos olhos pra fora mora a liberdade, saiu publicado pela
FiloCzar, uma editora-biblioteca-livraria que funciona na casa do seu
proprietário, César Mendes da Costa, 36 anos, no Parque Santo Antônio,
também na zona sul.
PIONEIRO – Cesar Mendes criou a FiloCzar, uma das poucas livrarias da periferia de São PauloFoto: Marcelo Ximenez/CMSP
A FiloCzar é uma raridade: uma livraria localizada na periferia
paulistana. Em meio à paisagem dominada por bares e igrejas evangélicas,
as estantes apinhadas com 3 mil livros chamam a atenção de quem passa
pela rua. “Tem gente que entra aqui e conta que nunca tinha visto uma
livraria na vida”, diz César. No bairro, os livros ainda são objetos
raros, e a leitura uma atividade exótica. “A biblioteca pública mais
próxima fica a 40 minutos de ônibus”, conta. Sem livros à mão, ele
encontrou as primeiras leituras nos jornais amassados que a família
usava para embrulhar compras. Não parou mais – apesar dos conselhos das
pessoas à sua volta, que diziam: “não leia tanto, senão vai ficar
doido”.
“O livro não é uma experiência de massa. Ainda somos basicamente uma
sociedade oral”, avalia César. Há quatro anos, ele abandonou o emprego
de professor de filosofia na rede pública e decidiu fazer sua parte para
mudar o que puder dessa realidade, criando a FiloCzar. A livraria,
explica, serve para financiar uma escola livre, que inclui cursos,
seminários, cafés filosóficos, cineclube, uma biblioteca comunitária e a
editora, que já publicou 13 livros. A única funcionária do
empreendimento é sua irmã. Contratada com carteira assinada, ele
ressalta. “Uma coisa que [o filósofo alemão] Karl Marx ensina é que não
devemos explorar”, afirma, destacando um dos aprendizados que ganhou com
a leitura.
DIREITO ESSENCIAL
Tanto Casulo (o poeta-funileiro-artista-plástico do Socorro) como
César (o livreiro-filósofo-editor do Parque Santo Antônio) participaram
dos debates realizados pela Câmara Municipal de São Paulo (CMSP), no ano
passado, que desembocaram na criação do Plano Municipal do Livro,
Leitura, Literatura e Biblioteca (PMLLLB) do Município de São Paulo,
nascido de um projeto de lei do vereador Antonio Donato (PT), presidente
da CMSP. Para César, é um plano que deveria ter sido criado há muito
tempo. “O mérito dessa lei é colocar em xeque um modelo de sociedade em
que o livro não é contemplado”, afirma.
AUTOR – Donato criou o projeto de
lei que deu origem ao Plano Municipal
Foto: Gute Garbelotto/CMSP
Os números dão razão a ele. Pesquisa da Escola do Parlamento da CMSP
realizada neste ano aponta que 52,4% dos paulistanos nunca leram ou
pouco leem livros. E tem mais.
O Indicador de Alfabetismo Funcional
(Inaf), elaborado pelo Instituto Paulo Montenegro e pela ONG Ação
Educativa, mostra que 27% das pessoas entre 15 e 64 anos são analfabetas
funcionais, incapazes de interpretar textos simples ou entender um
gráfico.
E o ambiente escolar ainda está longe de conseguir transformar seus
alunos em leitores. Prova disso são os 53 mil estudantes que, em 2015,
tiraram nota zero na prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio
(Enem). São milhares de jovens que passaram boa parte da vida entre os
muros da escola e mesmo assim não aprenderam algo tão básico como pegar
uma caneta e discorrer sobre um tema numa folha de papel. Simplesmente
porque a leitura não faz parte do seu mundo.
Foi com o objetivo de promover esse hábito e combater os altos
índices de analfabetismo funcional que o governo federal criou, em 2006,
o Plano Nacional do Livro e Leitura. “O direito à leitura é
imprescindível, pois é a chave para o acesso a todos os outros
direitos”, afirma José Castilho Marques Neto, secretário-executivo do
Plano Nacional. Os estudantes reprovados na redação do Enem são um bom
exemplo, segundo ele. “São jovens que não conseguiram acesso ao ensino
superior por deficiência na leitura”, explica.
O Plano Nacional está equilibrado em quatro eixos. O primeiro é a
democratização do acesso, baseada principalmente na valorização e
expansão das bibliotecas públicas. A seguir vem o fomento à leitura e à
formação de mediadores (pessoas que apresentam a leitura a quem não lê),
desde bibliotecários e professores até pais ou vizinhos (os saraus
também são um bom exemplo de mediação de leitura). O terceiro eixo leva o
nome de “valorização institucional da leitura e incremento de seu valor
simbólico” e significa transformar o incentivo à leitura em política de
Estado e criar ações para conscientizar a população sobre a importância
do ato de ler. O quarto eixo é o desenvolvimento da economia do livro,
por meio de ferramentas que incentivem a produção, a distribuição e a
circulação de títulos.
Hoje, dez anos após a aprovação, o Plano Nacional conseguiu provocar
mudanças importantes, segundo o secretário-executivo. “Em 2005, o Brasil
tinha mais de 1.700 cidades sem biblioteca. No final de 2010, já eram
mais ou menos 30”, compara. O número de municípios sem biblioteca só não
vai a zero, segundo ele, porque é um dos primeiros serviços que as
pequenas prefeituras costumam cortar assim que ficam sem dinheiro.
Por isso, Marques Neto acredita que o Plano Nacional do Livro e
Leitura só vai se realizar para valer quando todas as cidades do Brasil
tiverem o seu próprio. “Com a aprovação dos planos municipais, os
programas de leitura deixam de depender da vontade dos prefeitos e se
tornam uma política de Estado”, diz. Nesse sentido, ele afirma que o
PMLLLB paulistano seguiu o caminho correto: “o de São Paulo é um texto
feito rigorosamente a muitas mãos”.
A VÁRIAS MÃOS
De fato, as primeiras articulações que levaram à criação do plano
paulistano vieram de baixo para cima. Começaram em 2012, a partir de
encontros que reuniam pessoas interessadas em pensar políticas públicas
para a leitura e o livro na cidade. Entre eles, estavam a ONG
Literasampa, o centro de pesquisa Biblioteca e Centro de Pesquisa
América do Sul – Países Árabes (BibliASPA), os integrantes do Sistema S
(Senai, Sesc e Sesi) e o Fórum Mudar São Paulo, que naquele ano lançou
um manifesto chamado Por uma política do livro e do incentivo à leitura para o Município de São Paulo.
A partir daí, o debate iniciado na sociedade avançou por Executivo e
Legislativo adentro. Em 2014, o prefeito Fernando Haddad (PT) publicou
uma portaria intersecretarial criando um Grupo de Trabalho (GT)
encarregado de criar a versão paulistana do Plano Nacional do Livro e
Leitura. Ao grupo, além das entidades da sociedade civil que já vinham
conversando sobre as propostas, juntaram-se representantes da Prefeitura
e da Câmara Municipal. O plano paulistano manteve os quatro eixos do
nacional e acrescentou um, a literatura.
O Grupo de Trabalho realizou dezenas de encontros públicos, além de
plenárias temáticas e regionais. “Existe em São Paulo uma cena muito
forte da sociedade civil na área de livro e leitura e isso foi
determinante para a construção do Plano Municipal do Livro”, avalia o
bibliotecário Ricardo Queiroz Pinheiro, assessor parlamentar do vereador
Donato, que atuou no GT como representante do Legislativo.
Donato levou o texto redigido pelo grupo diretamente ao Plenário da
CMSP, na forma de um substitutivo para o projeto de lei (PL) 168/2010,
que já havia sido aprovado em primeira votação no ano de 2010, antes de
Donato deixar a vereança para atuar como secretário de governo da
Prefeitura, cargo em que permaneceu até 2013. “Com isso, conseguimos dar
agilidade à tramitação do Plano, que só precisou de mais uma votação
para ser aprovado”, explica Pinheiro. Após passar em Plenário sem
modificações, o Plano Municipal foi sancionado pelo Executivo em 18 de
dezembro, tornando-se a Lei 16.333/2015.
A diversidade dos participantes das discussões, que incluía a
presença de coletivos de leitura, pequenas editoras e movimentos
periféricos, chamou a atenção. “Os debates no processo de elaboração do
Plano Municipal mostraram que o livro no Brasil deixou de ser um objeto
restrito à elite”, afirma o editor Haroldo Ceravolo, presidente da Liga
Brasileira de Editores (Libre) e um dos membros do GT que redigiu o
Plano.
As novas vozes da literatura brasileira, contudo, ainda precisam
brigar para conquistar seu espaço. “A produção literária das pequenas
editoras, dos saraus de periferia, das mulheres e dos negros não tem
espaço nos jornais, não chega às livrarias e ainda é pouco representada
nas bibliotecas públicas”, aponta Haroldo. Numa (nova) palavra, o que
falta é bibliodiversidade – que Haroldo define como “o conceito de que
devemos ter o máximo possível de editoras representando o maior número
possível de vozes da nossa sociedade”.
O termo aparece no texto aprovado do Plano Municipal, que propõe “o
estímulo à bibliodiversidade em todas as suas formas”, inclusive na
compra de obras para as bibliotecas públicas e escolares. Por essas e
outras medidas da lei, Haroldo acredita que o impacto pode ser
revolucionário. “Se o roteiro previsto no Plano Municipal for
implementado, pode mudar o panorama do livro na cidade de São Paulo”,
afirma o editor.
LETRA, GALHO E PASSARINHO
Numa conferência em que contou sobre suas primeiras leituras, Paulo
Freire, um dos maiores educadores do Brasil, demorou a falar de letras e
palavras. Em vez disso, falou de passarinho, árvore, cachorro. Relembrou o quintal da casa onde engatinhou pela primeira vez, os galhos
dóceis à sua altura onde conseguia subir, o canto do sanhaçu e do
bem-te-vi, o verde da manga-espada verde, o verde da manga-espada
inchada, o amarelo esverdeado da mesma manga amadurecendo. Tudo era
leitura. É que, antes de conhecer as letras, o menino já lia a realidade
ao seu redor. “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que
a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da
leitura daquele”, afirma Freire, no livro A importância do ato de ler,
que transcreve uma conferência de 1981. Segundo o educador, a leitura
da palavra escrita só ganha sentido quando vem carregada das
significações da experiência de vida de quem a lê.
Daí que um dos obstáculos para a expansão da leitura é a distância
que muitos brasileiros sentem em relação aos livros, vistos como objetos
exóticos, que não fazem parte das suas vidas. Na CMSP, há dois PLs que
buscam aproximar os livros do dia a dia da população aproveitando a
estrutura do transporte público. Um deles é o 266/2014, de David Soares
(Democratas), que propõe a criação de bibliotecas nos pontos de ônibus,
num espaço batizado de Parada Cultural. Já o 547/2014, de Alfredinho
(PT), cria o Programa Leitura nos Ônibus e prevê a instalação das
bibliotecas dentro dos próprios veículos.
Uma prática semelhante ao dos projetos já é feita pelo coletivo
Perifatividade, que instala pequenas bibliotecas em locais como bares,
salões de cabeleireiros ou ocupações de sem-teto. “O objetivo é fazer
com que os livros se tornem mais familiares, corriqueiros. Aumenta a
chance de que sejam lidos”, explica Ruivo Lopes, membro do coletivo e
educador da ONG Ação Educativa.
MUDANÇA – Para o educador
Ruivo Lopes, leitura é ferramenta
pra transformar realidades
Foto: Ricardo Rocha/CMSP
Ruivo, que atuou nos debates do Plano Municipal do Livro como
representante dos saraus de periferia, define-se como um “leitor
tardio”, por só ter descoberto os livros durante a adolescência.
Em
casa, na periferia da Baixada Santista, só havia uma Bíblia e um livro
de receitas. Sua escola possuía biblioteca, mas não era um ambiente
acolhedor. “Uma vez tentei entrar ali com um grupo de amigos, mas a
bibliotecária não deixou, porque disse que a gente iria ‘mexer no
acervo’”, lembra.
Superar a cultura das bibliotecas de portas fechadas, que se
preocupam mais com os livros nas estantes do que com as pessoas que
poderiam usá-los, é outro dos desafios para chegar a um país de
leitores. “Lembra das salas trancadas com livros sem uso que os
estudantes da rede estadual descobriram quando ocuparam as escolas, no
final do ano passado? Isso ainda é muito comum em algumas bibliotecas. É
o pensamento patrimonialista, de que a função mais importante de uma
biblioteca é preservar os livros”, afirma Ricardo Queiroz, assessor do
vereador Donato.
Os profissionais da área nunca foram muito de se misturar. “O
bibliotecário sempre teve resistência a participar de fóruns de
debates”, reconhece Waltemir Nalles, coordenador do Sistema Municipal de
Bibliotecas de São Paulo, formado por 54 bibliotecas, 14 pontos de
leitura, 13 bosques de leitura e 12 ônibus-biblioteca, além das 46
unidades dos Centros Educacionais Unificados (CEUs). Prova disso é o
fato de o movimento dos saraus de literatura periférica ter surgido em
locais como bares, praças ou até funilarias. “Nossas portas não estavam
abertas para essas pessoas”, reconhece Nalles. Mas ele também afirma que
as coisas estão mudando. Hoje, muitos saraus já realizam edições dentro
de bibliotecas.
Para prosseguir no processo de aproximação entre esses locais e a
comunidade, o Plano Municipal da Leitura prevê a criação de “horários
alternativos de funcionamento” – o único jeito de garantir o acesso à
maioria dos trabalhadores, que não tem como frequentá-los em horário
comercial.
Outra medida do Plano paulistano para as bibliotecas busca ampliar a
variedade dos títulos presentes nas estantes, que hoje ignoram os
autores independentes e as pequenas editoras. Segundo Nalles, a seleção
de livros é quase toda baseada nas resenhas dos jornais e das revistas
de grande circulação, que geralmente só têm olhos para as grandes
editoras. Para ampliar o leque das escolhas, foi criada uma comissão,
formada por representantes da sociedade civil e das secretarias da
Educação e Cultura, que vai definir uma política para o desenvolvimento
das coleções de livros das bibliotecas públicas da cidade. A novidade é
uma das consequências do Plano Municipal do Livro.
Para mostrar como a aproximação com as comunidades pode fazer bem
para as próprias bibliotecas, Nalles conta o caso da Menotti del
Picchia, no Limão, zona norte, que volta e meia era vítima de invasores
que praticavam furtos e quebra-quebra no local. “Depois que a
instituição se abriu para receber os saraus e outros eventos, acabou a
depredação. Hoje podem deixar a porta aberta que não tem problema. A
aproximação com a comunidade muda tudo”, aponta o coordenador.
E mudanças têm tudo a ver com a leitura. Lembra Ruivo Lopes: “A
vivência do mundo nos ensina a ler a realidade apenas como ela é. A
capacidade de imaginar outras realidades depende da cultura e das
artes”. Ou, como escreveu o inglês Neil Gaiman (um dos escritores que
despertou no autor desta reportagem a paixão pela escrita que o levou a
se tornar jornalista), “a ficção pode levar você a um lugar onde nunca
esteve e, uma vez que tenha visitado outros mundos, nunca mais ficará
inteiramente satisfeito com o mundo onde cresceu”. Essa insatisfação,
ensina Gaiman, é boa: “Pessoas insatisfeitas podem modificar e aprimorar
os seus mundos”.
Semana incentiva leitura nas escolas
“O estudo e, especialmente, a leitura são necessidades permanentes.
São ‘causas’ de todos: governo e povo”, afirma o professor e vereador
Eliseu Gabriel (PSB) na justificativa do projeto que deu origem à lei
14.999/ 2009, que criou a Semana de Incentivo e Orientação ao Estudo e à
Leitura.
Organizado pelas secretarias municipais da Cultura, da Educação e da
Assistência Social, em parceria com a Câmara Municipal, o evento ocorre
na segunda semana de abril e está em sua quinta edição. A ideia é
apresentar palestras, simpósios, shows, concursos, gincanas e outras
vivências que estimulem a leitura. No ano passado, reuniu cerca de mil
pessoas.
EVENTO – Eliseu Gabriel criou a
Semana de Incentivo à Leitura
Foto: Ricardo Rocha/CMSP
Escritores de destaque já passaram pela Semana de Incentivo e
Orientação ao Estudo e à Leitura, entre eles Heloisa Prieto, Rodrigo
Lacerda, Victor Scatolin, Lúcia Hiratsuka e o multipremiado Milton
Hatoum.
APRENDIZADO – Alunos
participam da Semana de Incentivo
à Leitura
Foto: Divulgação
Projetos e leis que tratam da leitura
LEIS
16.333/2015 | Antonio Donato (PT) Institui o Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca (PMLLLB)
14.999/2009 | Eliseu Gabriel (PSB) Institui a Semana de Incentivo e Orientação ao Estudo e à Leitura
14.477/2007 | Noemi Nonato (PR) Cria a Semana da Leitura
PROJETOS DE LEI (*)
547/2014 | Alfredinho (PT) Cria o programa Leitura nos Ônibus, com espaço para livros dentro dos veículos
266/2014 | David Soares (Democratas) Cria a Parada Cultural, com bibliotecas nos pontos de ônibus
179/2014 | Claudinho de Souza (PSDB), Edir
Sales (PSD), Eliseu Gabriel (PSB), Jean Madeira (PRB), Ota (PSB), Reis
(PT), Toninho Vespoli (PSOL) Amplia as atribuições da Biblioteca Mário de Andrade
517/2013 | Paulo Fiorilo (PT) Institui o Programa Vale-Leitura aos profissionais de educação do Município de São Paulo
(*) Da atual Legislatura
SAIBA MAIS
Livros
A importância do ato de ler. Paulo Freire. Cortez, 1989. O direito à literatura. Artigo do livro Vários Escritos. Antonio Candido. Ouro Sobre Azul, 2004.
Leiaí a reportagem original Para ler o mundo, na seção de Cultura da Revista Apartes, nº 19, março/abril de 2016!
O novo livro é fruto de diálogos sobre Direitos Humanos e
oficinas de criação literária em escolas públicas das periferias de SP.
O
documentário registra todo o processo em mais de uma dezenas de
encontros com gestores escolares, professoras/es, funcionários,
familiares e estudantes.