sábado, 30 de outubro de 2010

O "proibidão" do Brandão


Desde os anos 70, quando o romance Zero foi proibido pela ditadura militar, Inácio de Loyola Brandão não via um festival de sandices como o ocorrido recentemente, quando se provocou celeuma em torno de um conto seu, escrito há 27 anos, adaptado para teatro e vídeo e traduzido em não sei quantas línguas. Obscenidades Para Uma Dona de Casa está incluído na antologia Os Cem Melhores Contos do Brasil, de Ítalo Moriconi. Há na história solidão, humor, sensualidade. O conto, indicado para alunos do ensino médio, provocou revolta em mentes mais estreitas, pais indignados, professores assombrados. Um jornal ouviu alunas do Colégio Amadeu Amaral que acentuaram: "Não tem nada além do que já ouvimos na rua e na escola." Um juiz ficou estupefato: "É um falso moralismo que não leva a nada." Já alunas de outro colégio, primeira linha, campeão do Enem, disseram que o "texto é nojento e faz o sexo parecer horrível, em vez de prazeroso". Cadê a professora que não ensina a ler? Não explica a vida?
Os pais que reclamaram conversaram com os filhos? Trocaram ideias? Olharam em torno? Inquisidores de plantão olhem em volta! Atualizem a folhinha, estamos em 2010. Para alguns, estamos na Idade Média. Inquisição, fogueira para os infiéis. Leia o conto aqui.

O Fino do Fino Zimbo é uma palavra africana que significa prosperidade. E não é preciso ir longe para concluir que a escolha do nome vingou. Na ativa há 46 anos e com mais de 40 discos gravados, o “trio dos trios” ainda mantém seu posto na esfera das entidades musicais de maior respeito e influência no Brasil e no mundo. O trio se consagrou como um dos principais expoentes da bossa nova nos anos 60, e foi um grande divisor de águas para a música instrumental brasileira. Entre experimentações e inovações, em 1973, o trio decidiu investir na formação de músicos. Criaram então o CLAM – Centro Livre de Aprendizagem Musical, voltado para a “formação musical ampla, sem separação entre erudito e popular”. A formação original do Zimbo Trio reuniu o baixista e criador do grupo Luiz Chaves (falecido em 2007), Rubens Barsotti, o “Rubinho”, na bateria, e Amilton Godoy no piano. Foi ele quem concedeu a entrevista para Débora Pill, da revista +Soma(set. de 2010, #19). No site da revista você pode conferir fotos do arquivo pessoal além de vídeos.

Como o músico instrumentista era visto quando vocês começaram?Na época, músico instrumentista só tocava o que a gente chamava de “fundo de conversa”, música ambiente. Ninguém queria saber, ninguém queria ouvir. A gente queria tocar um som que dignificasse a música brasileira, mas sem depender de um cantor pra isso.

E foi assim que vocês começaram?O Zimbo começou na Roosevelt e acabou conquistando a crítica. Na sequência a gente começou a ensaiar com a Norma Bengell, que havia acabado de chegar da Itália e procurou o Rubinho. Ela gostou do nosso som, e a gente começou a ensaiar

O que mudou nesse cenário depois do Zimbo?
Antes os músicos não eram valorizados. O Zimbo começou numa fase muito feliz, porque existiam disc-jóqueis que escolhiam o que havia de melhor pra tocar nas rádios. E então começou a aparecer quem até então fazia jazz, fazia outros gêneros, e passou a fazer música brasileira. Acho que esse foi o grande legado do Zimbo: não precisar mais usar temas estrangeiros, poder fazer o jazz e tudo mais com tema brasileiro. Fomos o primeiro grupo instrumental com essa proposta, mostramos que era possível, porque o disco foi pra parada de sucesso. Quem iria imaginar que no Brasil poderia ter um disco instrumental no primeiro lugar da parada de sucesso

Fala um pouquinho mais sobre como funcionavam as rádios naquela época.
Na época em que começamos o rádio era bom. Os disc-jóqueis tinham muito conhecimento pra avaliar o que apresentavam. Os principais nomes eram o Walter Silva e o Fausto Canova. Foi o Fausto, inclusive, quem organizou o concurso pra dar nome ao trio. Mas isso faz tempo. Hoje em dia rádio está uma porcaria. Hoje só ouço futebol. Música não dá pra ouvir.

E a CLAM, como surgiu?A escola CLAM nasceu em 1973, porque os três eram muito procurados pra dar aula particular. Não havia formação decente na época, as músicas eram executadas sem grande conhecimento de harmonia.
Qual era a proposta da escola?A ideia era formar professores de qualidade, que lecionassem um conteúdo diferenciado, completo. As escolas da época formavam intérpretes que executavam a música, mas não tinham o conhecimento da obra. Só focavam na forma, não no conteúdo, entende? E o tom? E a distribuição do acorde? Qual a harmonia? É basicamente a diferença entre Beethoven e Mozart. Por que o Beethoven foi tão importante? Mozart era primitivo, técnico. Beethoven ouvia com o ouvido de dentro.

O que é um bom músico pra você?Um bom músico é um arranjador. Ele precisa ser criativo, pegar uma música e deixá-la da forma como ele acha que deve ser. Os DJs fazem isso. Põem aquilo do jeito deles, fazem outra proposta, repetem, misturam com um ritmo diferente. Deve ser muito legal pra um compositor ouvir a música dele produzida por um DJ. Fica diferente

Como você vê o músico instrumentista hoje?As pessoas fazem o seu trabalho sem esperar que sejam chamadas ou tenham um contrato com uma gravadora. Pagam do próprio bolso. Às vezes a pessoa consegue que esse disco que ela mesma pagou e produziu seja distribuído por um selo importante, e aí consegue ter um retorno. Naquela época os caras iam atrás da gente, as gravadoras procuravam, bancavam, pagavam royalties. O disco sempre foi, e vai continuar sendo, o cartão de apresentação do músico. Você entrega um cartão de visita pra uma pessoa pra dizer quem é. A gente apresenta um disco. Estamos passando por um período muito complicado, as gravadoras estão acabando. Elas tinham uma porção de incentivos na mão, mas não prepararam o público pra ouvir uma coisa de qualidade. Não usaram isso, não formaram um público pra elas, estão sendo vítimas do próprio desleixo musical.

Explica melhor essa história de formação de público.Vi uma entrevista muito interessante com a Sandy. Ela parece estar em um processo de se liberar da necessidade do sucesso, de sair daquela coisa Sandy & Junior. Acho que ela se deu conta de que existe mais coisa além daquilo, então quis sair de um mundo em que ela estava acostumada a transitar com enorme sucesso e percebeu que onde estava querendo entrar não é tão fácil assim, entende? Porque ali tem um público que exige mais, uma outra condição, não aquele primitivismo da música sertaneja, que fica trabalhando com acordes fundamentais. Pra circular nesse campo aqui, você tem que ter uma outra bagagem. E é esse público que eles nunca contribuíram pra melhorar, pra aumentar. Não fizeram nada pra melhorar o nível da platéia que tinham, pra que ela pudesse exigir uma coisa melhor. No Brasil, quando você quer fazer uma coisa de qualidade, não tem público na mesma quantidade, na mesma dimensão que tem pra algo pior.

E como é que a gente faz pra afinar os ouvidos?Uma coisa que não ajuda em nada é esse negócio de ficar repetindo, há anos e anos, que o rei é sempre aquele. Faz quinhentos mil anos que conheço o trabalho do Roberto Carlos, e ele jamais trabalhou com uma música mais elaborada. Aliás, os músicos dele são proibidos de usar acordes mais elaborados, ele não deixa. E ele é considerado o rei! Às vezes penso um pouco no futebol... Existem jogadores que são completamente realizados, já atingiram tudo que um jogador pode alcançar. Mesmo que não estejam bem, técnico nenhum do mundo tem coragem de tirar do time. Nós temos sofrido desse mal, e tem gente nova querendo e merecendo uma oportunidade e não tem. A questão é que não houve progresso no conhecimento musical de qualidade. Hoje em dia o acesso à música de qualidade, em um âmbito mais amplo, está difícil. Os maiores sucessos ainda são músicas primitivas. Então a solução que a gente encontrou foi através da escola. A gente tenta passar para os alunos cultura geral, informações do que o país tem de melhor e mais nobre: música bem feita e bem executada.

E as rádios de hoje não ajudam… São raras as exceções.Pois é. Quando eu vou pra Bauru, ouço um locutor da minha cidade falando com o mesmo tom do cara que fala aqui. E não só no jeito, mas também falando as mesmas coisas sobre música, enaltecendo uma música que não é nossa, e a música regional de qualidade que rola por lá não tem nenhum espaço. Aí você vê o que essa indústria fonográfica formou. O cara não tem o que dizer porque não tem conteúdo. É a mesma lógica de quando a gente leva o disco pra fazer divulgação na rádio e ouve: “Desculpa, essa aqui não vai tocar.” Por quê? “Ah, isso aqui não vende.” Mas é o contrário: não vende porque você não toca! Como é que o cara vai comprar se não conhece?

De Cuba para Gismonti O multi-instrumentista brasileiro Egberto Gismonti recebeu do Ministério de Cultura de Cuba a maior premiação do órgão, a Distinção pela Cultura Nacional. Gismonti é conhecido no país caribenho pela parceria com o maestro cubano Leo Brouwer, o qual endossou a premiação. Os dois trabalharam juntos na peça musical Gismontiana. Gismonti retribuiu o prêmio reconhecendo que "os brasileiros sentem muito respeito e admiração pelos amigos, músicos e a música de Cuba". Na ocasião da premiação, Gismonti executou sua música Água e Vinho.

Falou e disse Em evento no Rio de Janeiro, Chico Buarque se disse um entusiasta da campanha de Dilma Rousseff para presidente por considerá-la a favor do diálogo com as diferenças e movimentos sociais, como o MST. “É um governo que fala de igual para igual: não fala fino com Washington e não fala grosso com a Bolívia e o Paraguai e, por isso mesmo, é respeitado no mundo inteiro”, disse Chico em um rápido discurso.

Agenda

31/10, 14h - Inauguração da nova sede da Biblioteca Terra Livre. Rua Engenheiro Francisco Azevedo, 841, sala 07- Perdizes - São Paulo (a 2 quadras do metrô Vila Madalena). Mais informações aqui.

2/11, 16h30 - Rediscutindo o anarquismo e o sindicalismo. Palestras com Lucien van der Walt no Ay Carmela. Rua das Carmelitas, 140, Metrô Sé (paralela à Rua do
Carmo, travessa da Rua Tabatinguera) Telefone: 3104-4330. Mais informações aqui.

domingo, 17 de outubro de 2010

Elite e povo: interesses irreconciliáveis

Em menos de 24h do resgate dos 33 mineiros que estavam soterrados a 70 dias em uma mina em San José, no Chile, um novo drama. Um mineiro morreu esmagado por uma pedra de uma tonelada na região de Valparaíso, no litoral chileno. Roberto Benítez Fernández, de 26 anos foi atingido enquanto trabalhava em um jazida a mil metros de profundidade. O mineiro colocava uma cunha na rocha, justamente para evitar que ela deslizasse. As condições precárias de trabalho impostas aos mineiros no Chile são bem piores do que o dramalhão novelesco criado pela imprensa durante o resgate do grupo da mina de San José. A situação dos mineiros, fragilizados pela flexibilização trabalhista, terceirizados por empresas estrangeiras e sujeitos a precarição, não é diferente em outras partes do mundo, inclusive no Brasil.

Ingratidão É correta a afirmação do presidente Lula de que neste país os ricos foram as pessoas que mais ganharam dinheiro no seu governo. Essas pessoas, disse Lula, na verdade, o que elas não conseguiram foi superar o preconceito. Enquanto no andar de baixo os mais pobres estão se alimentando melhor, fazendo prestações e comprando itens básicos para a casa, como, por exemplo, geladeira, da classe média para cima, nunca antes na história deste país ela viajou tanto para o exterior e comprou tantos carros importados com prestações iniciais a partir de um salário mínimo. Como se pode ver há, sim, uma oposição de interesses entre elite e povo. Os ricos ficaram mais ricos e os pobres mais exigentes. O exclusivo clube do andar de cima está desconfortável diante das exigências dos milhões de brasileiros que saíram da miséria e querem mais do país que lhes deve uma condição de vida melhor. Tudo o que o andar de cima não esperava ver é o povo escolher a candidata do presidente Lula, Dilma Rousseff, para a nova presidência do país.

Abortar ou não abortar não é a questão O segundo turno das eleições presidenciais iniciou com um retrocesso numa questão cara para milhões de mulheres brasileiras, principalmente a parcela pobre delas. Dados do sistema DATA-SUS para o procedimento médico-hospitalar - Curetagem Pós-Abortamento/Puerperal -, atingiu, em 2009, o número de 202.766 procedimentos. Mas esse número, seria apenas dos casos de gravidez em etapas avançadas e em geral de pacientes muito pobres que recorrem ao SUS em situações de risco iminente de aborto ou de seqüelas pós-aborto, externas ao Sistema (leia artigo sobre o tema aqui). Num falso assenso moralista, falsos moralistas de plantão, na imprensa inclusive, plantaram o tema da interrupção da gravidez indesejada no debate entre os dois candidatos a presidência. O falso moralismo da sociedade brasileira, abrigado, sobretudo, no andar de cima - o mesmo que também é a favor da pena de morte e não tá nem aí para as crianças nascidas sem direito a crescer dignamente beneficiadas pelas riquezas produzidas pelo país - falou mais alto e o tema, equivocadamente, voltou a ocupar o debate público de modo subjetivo, divino, rasteiro e policialesco quando na verdade deveria ocupar claras linhas nos programas de saúde pública dos candidatos que é o que objetivamente interessa.

Horror, Horror Nos último oito anos, o sociólogo Chico de Oliveira não poupou críticas ao governo Lula pelas opções políticas que fez. No entanto, suas críticas, situadas claramente no campo da esquerda, opõem-se as elites políticas atrasadas de direita, representadas hoje na candidatura demotucana de José Serra.
“Os governos tucanos têm horror ao povo. Isso não é força de expressão. É uma questão de classe social. Eles não têm contato com o real cotidiano popular. Eles não andam de ônibus, não têm experiência do cotidiano da cidade. Nem de metrô eles andam, o que é incrível. A cidade é grande, tem violência, a gente sabe. Mas eles não sabem como é o transporte, como são os hospitais, as escolas públicas. Há uma fratura real, eles perderam a experiência do cotidiano real. E isso não entra pelas estatísticas, só pela experiência. Por causa disso, o governo deles é sempre uma coisa muito por cima. Eles são pouco à vontade com o popular. Essa é a diferença marcante em relação a Lula”. Leia a entrevista completa concedida pelo sociólogo aqui.

Nada a comemorar São dois milhões os educadores no Brasil. Entre os futuros profissionais – matriculados nos cursos de Pedagogia – 40% têm renda mensal inferior a três salários mínimos e trabalham em outras atividades para complementar a renda. No último concurso público realizado no estado de São Paulo passaram 56 mil professores e serão efetivados somente 12 mil. O Estado não honra o piso mínimo dos professores e não há plano de carreira. O Dia dos Professores - 15 de outubro - é marcado como um dia de protesto. Leia mais aqui.

Subprefeituras de São Paulo mais pobres para os pobres A proposta orçamentária da Prefeitura de São Paulo para 2011 prevê reduzir verbas de subprefeituras localizadas em regiões pobres da capital. Por outro lado, áreas com moradores de maior renda média devem receber mais dinheiro, segundo o projeto de lei 444, entregue pelo prefeito Gilberto Kassab (DEM) à Câmara Municipal no final do mês passado. Confira.

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domingo, 3 de outubro de 2010

A "onda" verde e azul nas ruas

Alguém se esqueceu de avisar a boca de urna da campanha de Marina Silva (PV) que no dia do curral eleitoral era para fazer o eleitor surfar na “onda verde” e não na porcalhada de panfletos de candidatos do seu partido. Mas, como já adiantou o presidente do PV, à revelia até mesmo de sua maior estrela, nessa “onda”, os candidatos verdes não estão sozinhos não. Panfletos de candidatos do PSDB também emporcalharam a calçada por onde passaram os eleitores. Até na porcalheira, PV e PSDB surfam na mesma “onda”. Com um histórico político impecável, o futuro da “onda verde” Marina Silva no PV pode virar marola e morrer na praia. Nas fotos, um mar de panfletos tomou a calçada (acima) e parte do interior (abaixo) da escola Marina Cintra, na Rua Consolação esquina com a Antônia de Queirós.
Sorte grande Nas eleições mais despolitizadas desde que os militares aposentaram as botinas do poder civil, muitos eleitores decidiram seu voto com o panfleto do candidato que encontraram pelo caminho. Flagrante 1 De última hora, eleitoras decidiram seu voto apoiadas numa lixeira públicaFlagrante 2 Eleitor confere panfletos do candidato do PV jogados em escola pública

Momento de sabedoria Em tempo, artigo da psicanalista Maria Rita Khel vai direto ao que interessa. “Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro”. Leia a integra aqui.
[Foto: Ruivo Lopes | São Paulo (SP), outubro de 2010]