domingo, 19 de dezembro de 2010

A covardia do racismo brasileiro

O racismo no Brasil se caracteriza pela covardia. Ele não se assume e, por isso, não tem culpa nem autocrítica. Costumam descrevê-lo como sutil, mas isto é um equívoco. Ele não é nada sutil, pelo contrário, para quem não quer se iludir ele fica escancarado ao olhar mais casual e superficial. O olhar aprofundado só confirma a primeira impressão: os negros estão mesmo nos patamares inferiores, ocupam a base da pirâmide social e lá sofrem discriminação e rebaixamento de sua autoestima em razão da cor. No topo da riqueza, eles são rechaçados com uma violência que faz doer. Quando não discrimina o negro, a elite dominante o festeja com um paternalismo hipócrita ao passo que apropria e ganha lucros sobre suas criações culturais sem respeitar ou remunerar com dignidade a sua produção. Os estudos aprofundados dos órgãos ofi ciais e acadêmicos de pesquisa demonstram desigualdades raciais persistentes que acompanham o desenvolvimento econômico ao longo do século 20 e início do 21 com uma fi delidade incrível: à medida que cresce a renda, a educação, o acesso aos bens de consumo, enfim, à medida que aumentam os benefícios econômicos da sociedade em desenvolvimento, a desigualdade racial continua firme. Abdias do Nascimento, incansável aos 96 anos de vida intelectual e militância nas lutas negras no Brasil. Leia a entrevista completa aqui.

Ovos, Tomates e Saúde Pública Os governos federal, estaduais e municipais vêm há muito desenvolvendo argumentos e políticas de terceirização dos serviços de saúde e optando pela minimização das funções do Estado na saúde pública - o que põe a vida humana sob o jugo de critério impróprio, que é o critério do mercado, no fundo o mesmo que se aplica no comércio de ovos e tomates, a mesma lógica, os mesmos princípios. É inútil o médico e o enfermeiro se esmerarem no atendimento se ele for regulado pelas restrições impostas pelo primado do lucro ou pelas limitações que acabam redundando em economia de vida para fazer economia de dinheiro. A economia hospitalar acaba sendo dispensada da sensatez de uma economia política da vida, com repercussões muitas vezes danosas nos próprios serviços médicos; um cenário de descuidos em que a omissão de um técnico é, no mais das vezes, expressão e efeito do modo equivocado e até irracional como o conjunto da instituição hospitalar está organizada. Mais do que questões puramente médicas ou éticas, esses casos indicam uma questão sociológica de valores sociais, de concepções de referência na divisão do trabalho e na definição de procedimentos médicos e hospitalares. José de Souza Martins, sociólogo da USP, no artigo Nossos hospitais enfermos, aponta as verdadeiras razões por trás das recentes mortes em hospitais públicos paulistas: precarização do serviço de saúde decorrente da crescente terceirização de profissionais da área e da má qualidade da formação do agente de saúde para o serviço público.

A Ideologia da Segurança Nacional requentada O controle totalizante sobre as comunidades pobres dentro do paradigma bélico é um modelo muito usado pelos Estados Unidos nas ocupações que promove. E também é um modelo usado por Israel no tratamento do Estado Palestino. Isso significa que existe um atropelo das garantias, as áreas pobres ficam transformadas em territórios de exceção, onde não regem direitos e as garantias são completamente supérfluas porque trabalham com a ideologia da segurança nacional. O governo do Rio tem a polícia que mais mata do mundo, tem toda a ideologia do confronto. O paradigma bélico é comum, inclusive com o uso das forças armadas na segurança pública. As forças armadas norte-americanas jamais entram como polícia. Mas eles gostariam muito que as forças armadas da América Latina entrassem nessa função porque isso faz com que desmoronem. É um fiasco em relação aos objetivos a que ela se propõe, porque na indústria da guerra ela é um espetáculo: vende tanques e armas para os dois lados. O capitalismo é completamente alimentado pelas guerras. Se olharmos toda a história do capitalismo, a própria história dos Estados Unidos, percebemos que nas crises econômicas a guerra levanta a economia. E nós aqui estamos incorporando esse modelito, que é um modelo fracassado. Os Estados Unidos se retiraram do Iraque fracassados, estão se retirando do Afeganistão sem possibilidade de vitória, mas a indústria bélica e seus serviços são vitoriosos. E é essa indústria bélica que agora está sendo mimetizada para as políticas de segurança pública, porque política de segurança pública não tem nada a ver com o que está acontecendo, com a guerra. Há todo um mercado da violência e do controle da violência. Vera Malaguti, socióloga da UERJ, em recente entrevista joga luz sobre as ações militares nas áreas pobres do Rio de Janeiro. Leia a integra aqui.

Geopolítica do crime A farsa da operação de guerra e seus inevitáveis mortos, muitos dos quais sem qualquer envolvimento com os blocos que disputam a hegemonia do crime no tabuleiro geopolítico do Grande Rio, serve apenas para nos fazer acreditar que ausência de conflitos é igual à paz e ausência de crime, sem perceber que a hegemonização do crime pela aliança de grupos criminosos, muitos diretamente envolvidos com o aparato policial, como a CPI das Milícias provou, perpetua nossa eterna desgraça: a de acreditar que o mal são os outros. José Cláudio Souza Alves, sociólogo da UFRRJ, no artigo Violência no Rio: a farsa e a geopolítica do crime desnuda a farsa criminológica das ações miliatres nas áreas pobres do Rio de Janeiro sob a lógica da guerra ao terror.

Criminalização da pobreza Todo crime é político, é uma construção política. Quando você está prendendo gente com a mesma extração social, da mesma classe social, da mesma etnia, é claro que é político. Existem 62 mil brasileiros presos por furto. Declaração de Nilo Batista, jurista carioca, no seminário Encarceramento em Massa: Símbolo do Estado Penal. Ouça a declaração completa aqui.

Um comentário:

Anônimo disse...

Veja a reportagem da Revista do Brasil sobre a ocupação da Vila Cruzeiro e do conjunto de favelas do Alemão pelas forças policiais do Rio em novembro do ano passado. Nessa série de matérias, moradores do Alemão e de outras comunidades oferecem suas versões sobre o caso. A população do asfalto também é chamada para opinar, e defensores de direitos humanos avaliam tanto a operação quanto a política de segurança do Rio. Especialistas também criticam a espetacularização do episódio, caracterizado pela mídia empresarial em "guerra do Rio" para justificar violações de direitos nos morros cariocas. Acesse o link: http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/55/moradores-querem-influir-nas-decisoes/view