domingo, 14 de abril de 2013

Redução da maioridade penal: a democracia no lodo da desigualdade

 



O da pólvora
Apodrece penitente,
O da caneta
Enriquece impunimente,
A um, só resta virar crente
o outro, é candidato a presidente

 Os miseráveis, Sérgio Vaz
 
É o que eles querem, mais um pretinho na Febem.
Um homem na estrada, Racionais MCs

O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) completa 23 anos este ano. A lei é considerada um avanço constitucional, porque foi o primeiro instrumento criado na então recente democracia para proteger crianças e adolescentes no Brasil, principalmente aquelas em permanente condição de vulnerabilidade social agravada pela pobreza. Muito elogiado na época de sua aprovação, o ECA serviu de modelo para que outros países do mundo implementassem instrumentos semelhantes de proteção a crianças e adolescentes. Entretanto, o ECA vem sofrendo um obscuro linchamento público midiotizado e, como sempre, aproveitando-se da forte comoção social.

Como quase tudo no Brasil, cria-se primeiro a lei e depois joga-se para a sociedade disputar a sua implementação. É unanimidade para quem atua diretamente na defesa da criança e adolescente que a rede de proteção para essa significativa parcela da população brasileira ainda é muito deficiente. O diálogo intersetorial que deveria envolver a educação, cultura, trabalho, saúde, esporte, moradia e segurança ainda não resultaram em política públicas efetivas que tenham impacto satisfatório no desenvolvimento social pleno de crianças e adolescentes e que lhes dê a garantia de uma juventude e um futuro seguro. Porém, quando estes se envolvem em crimes, tornam-se facilmente alvos da pretensão de condená-los duplamente. A primeira pela desproteção da sua condição específica e segundo pelo peso desproporcional da lei que se aplica no país.

Nesse sentido, é desastrosa a ideia do governador de São Paulo Geraldo Alckmin de querer propor mudanças na maioridade penal. Ele declarou que pretende enviar ao Congresso Nacional um projeto para tornar mais rígido o ECA. A proposta do governador é que adolescentes que tenham cometido crimes e tenham completado 18 anos não fiquem mais na Fundação Casa. O governador também defendeu penas maiores para os crimes graves ou reincidentes.

Com essa posição, o governador Geraldo Alckmin, mais uma vez, dá mal exemplo ao se aproveitar da situação para apresentar sua débil ideia. O Brasil é o quarto país com a maior população carcerária do mundo. O Estado de São Paulo tem hoje 198 mil presos. Todos em celas superlotadas, distribuídos em presídios, centros de detenção provisória e delegacias em situação desumana e degradante. Em regime de privação de liberdade no país são aproximadamente 17 mil adolescentes, destes 9.016 só em SP. A maioria internada por tráfico de drogas e apenas 0,9% em ocorrências com vítima fatal. Lamentavelmente, a cada ano os números não param de crescer.

Seria melhor que antes de promoverem um linchamento de uma lei que ainda não foi implementada na dimensão que ela exige, fossem linchados publicamente os políticos e seus porta-vozes midiotizados que anseiam corromper o ECA e a sociedade não com o objetivo de proteger crianças e adolescentes, mas sim para reforçar um Estado Penal, afogando a democracia no lodo perverso da desigualdade.

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