domingo, 13 de setembro de 2015

O incentivo à leitura como política pública em SP



Distribuição de livros no Terminal Campo Limpo, zona sul de SP (Foto: Sarau do Binho)

O incentivo à leitura como política pública

Por Cristiane Gomes

Aprovado em 2011, o Plano Nacional do Livro e Leitura prevê que estados e municípios elaborem suas próprias políticas para a área; capital paulista está prestes a aprovar o seu.

A importância do conhecimento para a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática e justa é algo que ninguém pode questionar. E nesta tarefa, o livro tem papel de protagonista. Por isso, se faz fundamental a existência de políticas públicas de incentivo à leitura e à manutenção de bibliotecas que, aliadas à educação e a cultura, possam fazer a diferença. Neste sentido, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) foi instituído em 2011 pela presidenta Dilma Rousseff, como uma política de Estado cujo objetivo é nortear, de forma orgânica, políticas, programas, projetos e ações continuadas desen­volvidos no âmbito de ministérios – em particu­lar os da Cultura e da Educação – governos esta­duais e municipais, empresas públicas e privadas, organizações da sociedade e, em especial, todos os setores interessados no tema. O PNLL foi fruto de um amplo debate realizado em todo o país, envolvendo representantes de toda a rede produtiva do livro.

Como desdobramento do PNLL, os municípios e estados brasileiros tem a responsabilidade de produzir seus próprios planos. No que se refere ao estado de São Paulo, governado há 20 anos por um partido inimigo da educação (basta constatarmos a precária condição da rede estadual de ensino que teve como desdobramento a mais longa greve realizada pelos professores no começo de 2015), a questão está complicada. Diversos cortes do orçamento para a compra de livros para escolas do estado foram realizadas recentemente. “O Estado de São Paulo é refém de uma política cultural e educacional atrelada a objetivos pouco transparentes. Sabemos que revistas periódicas de baixíssima qualidade recebem dinheiro num volume espantoso, por meio de milhares de assinaturas, mas os recursos para aquisição de livros são baixos e, digamos, pouco democráticos pois priorizam apenas algumas editoras”, afirma Rogério Chaves, Secretário de Comunicação e Formação do SEEL, que destaca que o setor editorial de livros no Brasil tem ainda muito campo para desenvolvimento, mas que o fato dos Estados participarem com pouca intensidade é ruim para todos.

Mas a situação na cidade de São Paulo traz certo respiro e esperança na valorização do livro e da leitura como um dos instrumentos mais eficientes para concentração e difusão do conhecimento. A capital paulista está prestes a aprovar seu Plano Municipal do Livro Leitura Literatura e Bibliotecas, o PMLLLB.

Desde 2012, pessoas atuantes nas áreas da leitura, da literatura e do livro vêm discutindo uma política para o setor e a consequente necessidade de um plano municipal. Em abril de 2014, uma portaria intersecretarial publicada no Diário Oficial do Município constituiu o Grupo de Trabalho (GT) para elaborar o PMLLLB. Este GT foi composto por representantes do Executivo Municipal (Secretarias de Governo, Cultura, Educação e Direitos Humanos), da Câmara Municipal e da Sociedade Civil (ONGs, entidades de classe e militantes da leitura). Desde então, já foram realizados mais de 30 debates setoriais e muitas demandas, como reivindicações, propostas e sugestões para a composição do Plano,  vieram desses debates. Em abril deste ano, foram realizadas plenárias públicas com consultas à comunidade das seis regiões da cidade. O processo contou com uma ampla participação de representantes do movimento de literatura periférica da cidade, que conta com um movimento intenso de leitura nos saraus espalhados pelas quebradas paulistanas.

O educador e ativista cultural, Ruivo Lopes, lembra que, desde as iniciativas inovadoras no campo da cultura e educação promovidas pelo escritor Mário de Andrade, no começo do século 20, a cidade de São Paulo é pioneira em ações de acesso da população ao livro. Como a maior herança disso, ele destaca o pioneirismo dos ônibus-bibliotecas que, já na origem, disponibilizavam um acervo móvel mínimo para a população trabalhadora residente nos bairros mais distantes do centro da cidade. “Como tudo no Brasil, essas ações sofreram reveses, algumas acabaram e outras surgiram ao longo dos anos, como a discussão de políticas públicas de incentivo à leitura”, afirma o educador que representou no Grupo de Trabalho sobre a elaboração do PMLLLB, o segmento dos saraus literários espalhados pela cidade.

O PMLLLB da capital paulista inova ao incluir os saraus na elaboração de uma política pública específica que também leve em consideração o papel de formação literária que estes coletivos promovem, principalmente nas periferias da cidade. “É a primeira vez que São Paulo terá uma política pública exclusiva para o livro e a leitura, que promova a bibliodiversidade, reunindo todas as iniciativas já existentes, ampliando e melhorando o acesso, a produção, a mediação, equipamentos e a formação de público leitor. São Paulo não pode desperdiçar essa oportunidade de se tornar uma cidade leitora!”, conta Ruivo Lopes com entusiasmo.

“Nunca se erra quando se investe em ampliar o acesso ao conhecimento. O povo lê, sim, diferente do que o senso comum costuma repercutir. Tanto lê que a experiência dos jornais impressos gratuitos superam barbaramente as tiragens dos jornais convencionais. A experiência das bibliotecas comunitárias populares e do ônibus-biblioteca revelam êxito na ampliação do alcance”, acredita Rogério Chaves, Secretário de Comunicação e Formação do SEEL. A expectativa é que o PMLLLB seja discutido e votado pelos vereadores da Câmara Municipal em setembro.

Para nossa categoria, cerca de oito mil trabalhadores e trabalhadoras em todo o estado de São Paulo, a existência de uma política como o PMLLLB, além de trazer a alegria de contribuir com o cumprimento da função social do livro, se traduz também em melhores salários e condições de trabalho: mais livros produzidos, mais livros lidos. Claro que muitos desafios se apresentam, porém, eles existem justamente para serem superados. O Secretário de Comunicação e Formação do SEEL, Rogério Chaves destaca entre as prioridades de um plano como este, o aumento de tiragens e do investimento na distribuição nacional, valorização da bibliodiversidade e seus autores nativos, e a consequente redução do preço final do livro, para incentivar a leitura dos brasileiros. “Sabemos que em relação ao livro, a economia da cultura se faz com a associação de muitos elementos, entre autores, casas publicadoras, gráficas, papeleiros, distribuidoras, livrarias, bibliotecas, escolas, entre outros, mas fundamentalmente, com a relação primária do capital e da força de trabalho. E esta, a força-de-trabalho, quando mais qualificada e valorizada, só faz ampliar os horizontes de toda a sociedade”, afirma o secretário de comunicação e formação do SEEL.

Publicado originalmente em SEEL.

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